Ceará

Direitos Humanos

Torturas nos presídios: “Não são mais só denúncias, hoje nós temos flagrante”, diz Leila Paiva

Para a presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB, Leila Paiva, a prática de tortura nos presídios virou método.

Brasil de Fato | Fortaleza (CE) |
No começo de julho a Defensoria Pública do Ceará trouxe à tona novas denúncias sobre a prática de tortura dentro de unidades prisionais no estado do Ceará. - Foto: SOP/GOVCE

 

Novas denúncias sobre torturas contra detentos em diversas unidades prisionais do estado vieram à tona no início do mês de julho. Dentre os relatos, trazidos pela Defensoria Pública do Ceará, escoriações nas mãos, pernas, virilha, testículos e abdômen. O Brasil de Fato conversou com Leila Paiva, presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB sobre o assunto. Para ela, a tortura vem sendo empregada sistematicamente como método preventivo dentro do sistema prisional do estado.

No começo de julho a Defensoria Pública do Ceará trouxe à tona novas denúncias sobre a prática de tortura dentro de unidades prisionais no estado do Ceará. Novas, porque essas denúncias não vêm de hoje, desde setembro do ano passado uma série de investigações e ações judiciais têm afastado suspeitos e procurado entender o que está por trás e como funciona o sistema de tortura aplicado por policiais penais. Mas ainda em abril de 2019, um relatório do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT) já apontava o uso contínuo e sistemático de práticas de tortura por policiais penais do sistema prisional do Ceará. 

“Nós temos denúncias de todas as nuances, infelizmente. Nós temos denúncias de excesso; de utilização de spray de pimenta, inclusive nas genitálias femininas; nós temos quebra dos dedos das pessoas que estão privadas de liberdade; nós temos utilização de equipamentos de tortura; temos ausência de água potável; ausência de alimentação; ausência de produtos de higiene”, salienta Leila Paiva, presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB. 

A advogada, que atua há muitos anos dentro dessas unidades, enfatiza ainda que hoje esses relatos não são mais só denúncia. “Hoje nós temos flagrantes. Nós tivemos a vara de execuções que fez flagrante em 70 pessoas privadas de liberdade, nessa unidade, inclusive, as pessoas foram afastadas da unidade e a gente espera que isso, ao final do inquérito policial, possa responsabilizar os culpados”, ressalta Leila.

Para Leila, a prática não se trata de casos isolados, e sim de um método amplamente empregado pelos agentes penitenciários. “Como isso me parece ser um método utilizado pela Força Penitenciária Nacional, isso não é reação a qualquer comportamento interno dentro das unidades penitenciárias, isso me parece ser quase que um método preventivo. Eles têm utilizado isso como forma de garantir que as pessoas que lá estão não tenham nenhum tipo de reação”, afirma.

E continua. “Além de ser um método caro, absurdo, porque nós temos aí muito mais necessidade de efetivo para dar conta de toda essa violência dentro das unidades, ela é ineficaz, principalmente porque ela cria essa cultura do medo, que atinge a todo mundo. Não acho que seja uma coisa isolada, acho que é uma metodologia que está sendo utilizada. Eu estou falando isso porque a mesma prática foi identificada em outros estados onde a mesma Força Penitenciária Nacional está instaurada, então a gente precisa realmente que esse novo Governo democrático, inclusive na esfera nacional, fortaleça os instrumentos de garantia da democracia e dos Direitos Humanos internacionalmente”, defende Leila.

Agora, tanto a Comissão de Direitos Humanos da OAB como outros organismos cobram efetividade e celeridade nas investigações e punição dos culpados. “Nós precisamos que instrumentos como mecanismos de combate à tortura sejam instaurados no Ceará. Precisamos que as gestões que apoiam e efetivam esse tipo de prática sejam imediatamente substituídas e precisamos que os casos que estão denunciados, que estão nas mãos tanto da Corregedoria quanto nas mãos já da polícia para inquérito policial, da Vara, dos organismos internacionais e organismos nacionais, sejam apurados. A gente não pode deixar impune, um crime não justifica outro crime. Nós temos lá pessoas que cometeram delitos e agora estamos cotidianamente cometendo crimes contra eles. Isso não é aceitável”, finaliza. 

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Edição: Francisco Barbosa