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Cultura

Quatro espetáculos do Festival de Curitiba oferecem olhares para a cultura indígena

Através de tradições ancestrais e cosmovisões, as peças destacam a multiplicidade dos povos originários

Curitiba (PR) |
Ao longo da jornada como artista, Zahy fez do canto uma de suas expressões, o que poderá ser visto no espetáculo. - Foto: Daniel Barboza

Artistas indígenas têm ocupado espaços nas edições do Festival de Curitiba, estabelecendo um diálogo entre as artes e as culturas dos povos originários. Nesta 32ª edição, quatro espetáculos destacam-se ao trazerem à cidade diferentes cosmovisões do mundo.

Logo na cerimônia de abertura, o evento apresentou, pela primeira vez no Sul do Brasil, uma amostra do Festival Folclórico de Parintins, um dos principais patrimônios culturais do país. 

Segundo Daniela Sampaio, curadora do Festival, esta edição buscou abranger as produções culturais da região Norte, inaugurando o evento com uma manifestação popular brasileira.

“Para nós, era muito importante que uma festa popular como a dos bois de Parintins ocupasse o lugar de arte”, afirma Daniela.

Além da apresentação na abertura, o público pôde assistir a atração “Caprichoso e Garantido: O Duelo da Amazônia”, que integrou duas sessões na Mostra Temporada de Musicais, ambas tiveram os ingressos esgotados.

Além deste espetáculo, outras três obras trazem a representatividade indígena para os palcos de Curitiba: a performance-ritual “Ühpü”, “Azira’i” e Ta - Sobre ser grande.

Performance-ritual “Ühpü”


A apresentação é considerada pelos criadores uma performance de cura. / Foto: César Nogueira

A cerimônia “Ühpü”, corpo em Ye’pá Mahsã (Tukano), transita entre o teatro, a dança e a música, proporcionando ao público uma experiência de conexões sensoriais e sinestésicas coletivas, com sonoridades instrumentais, cantos e danças.

Conduzida por Bu’ú Kennedy Ye’pá Mahsã, artista plástico, palestrante e curandeiro, esta apresentação tem como objetivo preservar as tradições e divulgá-las tanto no Brasil quanto no mundo.

“Dirigir nossas histórias, movimentos e ações é um dos caminhos para alcançar o público, expressando, por meio do movimento, a importância da vida, da preservação da natureza e da cultura”, afirma o artista.

A cerimônia busca ser uma representação fiel de um ritual xamânico tradicional do povo tukano, aproximando a arte cênica das vivências indígenas, mas sem exotizá-las ou folclorizá-las. “Fizemos poucas adaptações, a cerimônia é quase a mesma que acontece na mata”, diz Bu’ú Kennedy Ye’pá Mahsã.

Serviço:

“Ühpü – Performance-ritual”

Mostra Lúcia Camargo – 32º Festival de Curitiba

Datas: 6 de abril às 20h30 e 7 de abril às 19h

Local: Museu Paranaense (Rua Kellers, 289 - São Francisco)

Classificação: Livre

Duração: 50 min

Azira’i


"Azira'i" nasce ainda do desejo que Zahy tinha de contar as suas histórias reais. / Foto: Daniel Barboza

Em “Azira’i”, a atriz Zahy Tentehar traz uma narrativa biográfica sobre a relação entre ela e sua mãe, a primeira mulher pajé da reserva indígena de Cana Brava, no Maranhão, onde ambas nasceram.

Zahy inicia se expressando em Ze’eng eté, sua língua materna, alternando com cenas em português, o que traz à cena o debate sobre os processos de aculturação aos quais foi submetida.

Leila Moreno, produtora artística da peça, destaca o movimento de expansão da diversidade nos espaços ocupados por artistas, não apenas atores e diretores, mas também equipes técnicas.

“Acredito que estamos vivendo um momento de ampliação de perspectivas, reconhecendo nossa multiplicidade e compreendendo nossa beleza e poder. Estamos em um movimento que tende a crescer”, afirma Leila.

Ao longo da peça, Zahy entoa lamentos aprendidos com sua mãe e canções originais por ela compostas. O espetáculo foca na performance, utilizando apenas uma cadeira e uma cortina de corda crua como elementos cênicos.

"Esta mostra nos convoca a refletir sobre a presença ou ausência desses artistas em todos esses anos. Onde estavam os artistas indígenas do Brasil?", questiona a curadora Daniela Sampaio.

Serviço:

Azira’i

Mostra Lúcia Camargo – 32º Festival de Curitiba

Datas: 6 de abril e 7 de abril às 19h

Local: Teatro da Reitoria (XV de Novembro, 1299)

Classificação: +12

Duração: 90 min

Ta - Sobre ser grande


Em alguns trechos, a peça faz referência à cidade de Manaus e ao seu caráter vibrante e multicultural. / Foto: Divulgação / Festival de Teatro de Curitiba

Na língua tikuna, "ta" é uma palavra que denota grandeza, tanto da floresta, dos rios e da fauna quanto do próprio povo tikuna, considerado atualmente o grupo indígena mais numeroso da Amazônia brasileira.

O espetáculo de dança, produzido pelo Corpo de Dança Amazonas, realizou sua estreia em um festival de teatro em Curitiba, entre os dias 30 e 31, com ambas as sessões esgotadas rapidamente.

Com 23 bailarinos, a apresentação alerta para as agressões sofridas pelos povos originários. Mário Nascimento, coreógrafo, destaca que o espetáculo simboliza não só o desejo de alcançar a grandeza para superar essas agressões, mas também a sobrevivência e resistência dos povos indígenas.

"É profundamente significativo, neste momento, mergulhar nessas questões e discutir a capacidade de ressurgimento desses povos, sua sobrevivência e resistência diante de 500 anos de agressões", ressalta Mário

Edição: Pedro Carrano