Ceará

Praia de Iracema

Moradores da Praia de Iracema e Poço da Draga reclamam do projeto de requalificação da área

Moradores alegam que projeto não dialoga com a área e nem atende às antigas necessidades da população.

Brasil de Fato, Fortaleza, Ceará |
O projeto da prefeitura prevê a construção de uma plataforma para saltos no mirante que ficará próximo à ponte velha, onde atualmente a prática de pulos é tradicional - Divulgação Seinf

Moradores da Comunidade do Poço da Draga reclamam da falta de diálogo com a Prefeitura de Fortaleza sobre o projeto de requalificação da Praia de Iracema, apresentado na última terça-feira (24). Prevista para começar em abril, a intervenção vai custar cerca de R$ 27 milhões em reformas que começam na avenida Rui Barbosa e seguem até o Poço da Draga, seguindo o padrão já construído para a Beira Mar.

O problema, de acordo com os moradores, é que o projeto não foi debatido com a comunidade e nem atende às necessidades antigas da área, como a falta de saneamento básico ou estruturas para o forte movimento cultural que já acontece no Poço da Draga. Além disso, o Plano apresentado pela Prefeitura não dialoga com a comunidade centenária, que resiste à especulação imobiliária e luta pelos seus direitos com consciência ambiental e política. 


Projeto apresentado pela Prefeitura irá requalificar 2 quilômetros da orla, desde a avenida Rui Barbosa, até o Poço da Draga / Divulgação Seinf

A jornalista e ativista cultural Roberta Bonfim, moradora da Praia de Iracema, critica o projeto apresentado e a falta de participação popular em mais uma reforma da orla. “A mudança de paisagem mexe com identidade, pertencimento, memória coletiva, territorialidade e saúde mental. O que interfere no senso de localização, especialmente de idosos. O projeto está com uma arquitetura pasteurizada, futurista, com um monte de concreto.  Além disso, não explicam como fica o esqueleto do aquário e nem como será a relação do Pavilhão Atlântico com a comunidade, ou onde ficarão os ambulantes, ou ainda qual o futuro da Ponte Metálica, marco histórico da cidade na sua relação com o mar. É importante que tomemos posse das nossas histórias para tratarmos a cidade, suas paisagens e narrativas com mais afeto, ressalta a jornalista e mestranda em psicologia ambiental.

Segundo o geógrafo e artista Sérgio Rocha, que preside o Conselho Gestor das Zeis (Zonas Especiais de Interesse Social) nenhum representante da comunidade do Poço da Draga foi convidado oficialmente para a reunião realizada no dia 6 de dezembro que reuniu secretários, vereadores, moradores, comerciantes e proprietários de hotéis da Praia de Iracema. “Soubemos por acaso, através de um morador amigo da Praia de Iracema e fomos lá. Ouvi e anotei o que foi apresentado e quando foi aberto o espaço para manifestações, solicitamos, como Conselho Gestor da Zeis, uma apresentação, e explicações para a comunidade. Uma nova reunião foi marcada para 15h, do dia 12 de dezembro, mas pouca gente compareceu, por conta do horário. As pessoas trabalham”, reclama o morador.

Serginho, como é conhecido pela comunidade, diz ainda que a prefeitura não entregou uma cópia do projeto para discussões internas dos moradores e garantiu que outras reuniões seriam realizadas para tirar as dúvidas, mas eles foram surpreendidos com o lançamento oficial do projeto. “Quando a gente viu já tinha o link para a licitação e a divulgação do projeto. Nós queríamos uma proposta em formato participativo e não houve. Foi algo feito e pensado de cima pra baixo”, alega.

O projeto da Prefeitura de Fortaleza prevê paisagismo com a plantação de mais de 1500 árvores em toda a extensão dos 2 quilômetros da obra, a construção de um novo calçadão com mini praças, caramanchões, ciclovia, iluminação em LED, banheiros públicos e 50 novas vagas de estacionamento. No Poço da Draga, as intervenções acontecerão no Pavilhão Atlântico e no seu entorno, além da troca do piso e reforma da quadra de esportes do Poço, reivindicação antiga dos moradores. Os tapumes do Acquário foram retirados e o calçadão da área será reformado criando um corredor de passagem que voltará a integrar a Praia do Havaizinho e o Poço da Draga à Praia de Iracema. Um muro será construído para contornar a obra inacabada do Acquário e se transformará em um mural que será pintado por artistas locais. 

Outra solicitação constante dos moradores será atendida já a partir da próxima semana, em virtude do afogamento do jovem Kewyn Freitas Melo, de 19 anos, no dia 13 de janeiro. Em entrevista ao BDF, o secretário da infraestrutura de Fortaleza, Samuel Dias, informou que uma dupla de guarda-vidas atuará na área, aos fins de semana, e ganhará um posto fixo no projeto de requalificação. “O local vai ser alinhado com a Inspetoria de Salvamento Aquático da Guarda Municipal de Fortaleza (GMF)”, disse o secretário.

Sobre as críticas à falta de diálogo, Samuel Dias informou que houve quatro reuniões para discutir o projeto e que todos os interessados foram convidados a participar. “O projeto está pronto, mas é possível fazer algumas intervenções para continuar atendendo a população. A grama sintética da quadra atende a um pedido dos moradores que foi incorporado ao projeto, assim como o piso intertravado das ruas perpendiculares que dão acesso à Praia de Iracema. Nós também iremos debater com a comunidade qual será a forma de utilização do pavilhão e ambulantes da área terão acesso a estruturas móveis para o comércio na orla”, destacou. Em nota, assessoria da Secretaria Municipal da Gestão Regional (SEGER) informou que esta realizando um estudo para desenvolver um projeto de ordenamento dos permissionários que trabalham na área que será requalificada. Os carrinhos padronizados serão entregues ao final da obra, que tem duração de 18 meses. Atualmente, 31 permissões foram entregues aos comerciantes que trabalham na Praia do Hawaizinho.

O projeto da Prefeitura de Fortaleza também prevê a construção de uma plataforma para saltos no mirante que fica próximo à ponte velha (Ponte Metálica), onde atualmente a prática de pulos é comum entre moradores e frequentadores da praia. A ideia da prefeitura é desestimular a prática no local por falta de segurança da estrutura que acumula ferragens e fissuras. “A Ponte Metálica tem essa questão da segurança, mas nós nunca pensamos em demoli-la. É um registro histórico da nossa cidade e nós queremos preservar essa tradição do salto, oferecendo uma alternativa que elimine os riscos”, afirmou Dias. Desde julho de 2022, a Ponte Velha, a Ponte dos Ingleses e a Muralha Hawkshaw estão contemplados no processo de tombamento histórico iniciado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).  

Obras do Governo do Ceará

Duas estruturas de responsabilidade do Governo do Ceará estão localizadas no trecho da Praia que será requalificado. O Acquário está sob a responsabilidade da Secretaria de Infraestrutura do Ceará (Seinfra). Em nota, a assessoria de comunicação informou que mantém a guarda do canteiro de obras do Acquario, incluindo limpeza, iluminação, segurança e proteção catódica (processo permanente que protege fundações e estacas, principalmente contra a maresia), atendendo às exigências dos órgãos de controle. Disse ainda que a obras está no pacote de concessões do governo do estado, mas não menciona prazos.

Já sobre a Ponte dos Ingleses, que estava em obra desde 2021, a Superintendência de Obras Públicas (SOP) informou em nota, que houve um descumprimento contratual por parte da empresa ABTEC e posterior rescisão do contrato. O processo para a contratação de uma nova empresa está em fase de conclusão e a obra deve ser retomada em fevereiro de 2023.

 

Edição: Camila Garcia