Ceará

Preço do combustível

Entrevista | “Independente do resultado do dia 2, combustível e gás sofrerão aumento no preço”

O economista Fábio Sobral conversou com o Brasil de Fato sobre a relação das eleições e a queda no preço do combustível

Brasil de Fato | Fortaleza (CE) |

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A Petrobras pode ser dirigida sem prejuízo da empresa para que os combustíveis não sejam exorbitantes, não extraiam uma renda extra da população. - Wiki commons

Consumidores tem observado que o preço da gasolina comum vem caindo no último mês, a média está em torno de R$4,89 por litro, de acordo com informações divulgadas pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis. Mas o que motivou essa mudança, uma vez que chegou o derivado de petróleo chegou a custar quase R$ 8,00? Será apenas pela redução da arrecadação do o Imposto de Circulação Sobre Mercadorias e Serviços (ICMS) pelos estados depois da aprovação da Lei Complementar 194? Será um aceno de mudanças na economia? Será uma situação passageira? É possível que o valor da gasolina volte a aumentar? Para responder essas e outras perguntas, o Brasil de Fato conversou com Fábio Sobral, economista e professor da Universidade Federal do Ceará. 

Por que está acontecendo essa queda nos preços dos combustíveis?

Eu atribuo totalmente ao período eleitoral, entende? Isso demonstra que o preço dos combustíveis pode ser acessível. A Petrobras pode ser dirigida sem prejuízo da empresa para que os combustíveis não sejam exorbitantes, não extraiam uma renda extra da população. Na verdade, isso se chama lucro extraordinário, você eleva os preços, mesmo que eles deem justificativas supostamente técnicas, 'não, é a variação do dólar', 'a Petrobras decide pela variação do dólar'. Primeiro, não está correto variar o preço dos combustíveis internamente pelo dólar. Já que a maior parte do combustível é produzido internamente, então ele é produzido em reais, os salários das pessoas são pagos em reais, os custos são em reais, por que cobrar em dólar? Segundo, que o preço do petróleo é muito volátil, ele muda todos os dias no mercado internacional.

Se você for acompanhar, esse preço está sujeito a variações muito bruscas, uma guerra, um atentado terrorista, uma disputa entre dois países podem levar imediatamente o preço para cima, e geralmente os preços são muito rígidos para cair e muito elásticos para cima. A linguagem técnica da economia é essa: são muito elásticos para cima e muito rígidos para baixo. Eles sobem mais facilmente do que caem, então isso penaliza a população, porque a inflação brasileira, 50% dela é definida por órgãos governamentais, estatais, energia elétrica, remédios, assistência à saúde, passagens e, essencialmente, combustíveis. Quer dizer? Se você decide dar à empresa e aos acionistas o direito de subirem os lucros extraindo da sociedade brasileira, que mesmo quem não têm automóvel vai pagar mais caro em alimentos, mesmo quem não tem carro, moto acaba pagando esses custos mais altos porque os preços de todos os bens são influenciados por esses preços essenciais. Eles são chamados 'preços administrados'. Os preços administrados do Brasil são: combustíveis, energia, remédios, passagens, eles representam 50% da inflação.

Se você tiver no governo e quiser controlar 50% da inflação, você controla esses preços administrados, mas se você quiser liberar a inflação, empobrecer a população assalariada você descontrola esses preços. Retiraram os controles sobre os preços da Petrobras, ela usufruiu com lucros imensos que distribuiu a seus acionistas e, ao mesmo tempo, retirou esses lucros de onde? Eles não vieram assim de um local indefinido, eles vieram os nossos bolsos. Eles nos empobreceram para enriquecer essa parcela dos acionistas. Então, o aumento do preço dos combustíveis foi uma política de empobrecimento da população. Como eles ficaram com medo, o atual governo federal ficou com medo de perder as eleições, passou imediatamente a cobrar da Petrobras uma outra política de preços, ao mesmo tempo reduziu o ICMS, e ao reduzir isso, retirou verba dose stados para que os preços caíssem. Quer dizer, as verbas dos impostos que os estados arrecadam foi reduzida, ou seja, esses impostos iam para os estados e serviam para a educação, para o transporte, para a alimentação escolar, para a saúde. Então eles retiram, cortam daí para manter a alta lucratividade do setor de combustíveis.

Eles fizeram um truque. Se antes a conta era paga pelo bolso de cada um, eles passaram agora a fazer com que essa conta fosse paga pelos estados, reduzindo o preço dos combustíveis, e não tenho dúvidas de que há uma extrema boa vontade de parte dos donos de postos, de transportadoras, na própria Petrobras em querer manter este governo. Então eles fazem um sacrifício agora para tentar manter o controle do conjunto da Petrobras e do sistema de combustível.


Os preços dos alimentos subiram e os salários em média caíram, isso significa que as pessoas, na verdade, estão ganhando menos. / Filipe Araujo / AFP

Isso não seria um reflexo de estabilidade econômica?

Não. Na verdade, nós vivemos um momento de instabilidade econômica. Há uma confusão aí porque a economia está melhorando. Nós caímos em um buraco muito grande. Depois do golpe promovido contra a presidenta Dilma, o governo Temer cresceu um ponto, mas uma economia já lá embaixo. O governo Bolsonaro, com a economia lá embaixo e a covid, afundou ainda mais. Hoje nós ainda estamos vendo a recuperação lenta de setores atingidos por todo esse processo. Então parece que a economia está crescendo, mas na verdade nós caímos em um buraco tão grande e estamos escalando de volta para chegar lá no topo, ou melhor, um solo.

Nós estamos no subsolo e essa escalada aparece como crescimento econômico, mas nós vivemos uma economia instável, uma economia que o Ministério da Economia produziu com Paulo Guedes. Paulo Guedes e Temer, quando promoveram a reforma trabalhista, a reforma previdenciária, o abandono de leis trabalhistas de novo no governo Bolsonaro, fizeram com que a renda média das camadas trabalhadoras brasileiras caísse de R$ 2.600, lá no começo do governo Temer, para R$ 2.200 agora. Ou seja, se você pegar todos os salários do país, dividir pelo tamanho da população, você teria hoje um salário de R$ 2.200, uma perda de R$ 400 em quatro ou cinco anos. 

Os preços dos alimentos subiram e os salários em média caíram, isso significa que as pessoas, na verdade, estão ganhando menos de duas formas: primeiro que os salários caíram, segundo porque os preços estão mais altos, você já não compra a mesma quantidade de bens. Isso não é estabilidade. E olha, a economia brasileira depende em 60% do consumo das camadas assalariadas, se você corta o salário das pessoas você está dando um tiro no pé. Eles gostam tanto de tiro, né? Pois eles deram um tiro no pé da economia brasileira. Cortaram o salário das pessoas. A maior parte da economia brasileira depende desses salários. Ao cortar o salário, você corta o consumo das pessoas.

Então nós vivemos, na verdade, uma economia instável, uma economia concentradora de renda, que produz bilionários e, ao mesmo tempo, produz milhões com fome. Isso é totalmente instável. E por um motivo eleitoreiro alteraram a rota dos preços dos combustíveis e não tenho dúvidas, independente do resultado do dia 2 de outubro, logo no dia seguinte, combustíveis e gás sofrerão alteração para cima dos preços, recomendo até que quem tiver automóvel, abasteça antes, quem puder comprar um botijão de gás a mais, compre.

Então você acredita que logo após as eleições essa redução no combustível não vai mais existir e os combustíveis terão um aumento?

Eu acho que será quase imediato, porque o movimento dessa queda dos combustíveis é totalmente eleitoreiro. O governo federal, na figura do seu presidente passou o ano todo reclamando da Petrobras, uma reclamação que era na verdade propagandística, trocava até os presidentes. Se eu não me engano houve três presidentes diferentes, mas nada mudava, só muda agora próximo das eleições. Então é óbvio que a variável eleitoral, o motivo eleitoral é o fundamental para a queda dos preços, imediatamente após as eleições, é claro que pode ocorrer uma coisa inesperada, mas se eu fosse apostar, eu apostaria que o preço dos combustíveis vai subir na segunda-feira.


Nós vivemos, na verdade, uma economia instável, uma economia concentradora de renda, que produz bilionários e, ao mesmo tempo, produz milhões com fome. / Pedro Ventura/Agência Brasília

Qual é a nossa realidade em relação a esse momento de redução dos combustíveis dentro do cenário econômico que estamos vivendo?

É um cenário muito difícil onde você tem mais de 30 milhões de pessoas passando fome e você tem, como eu disse, salários em queda. Os novos empregos que são abertos não são, de fato, novos, são os empregos que foram fechados durante o período de crise no governo Temer, no governo Bolsonaro e na pandemia dentro do governo Bolsonaro. Então é um cenário difícil, mas com grandes possibilidades, porque se for alterada a visão econômica que dirige o Brasil, você pode recuperar essa economia.

Tem como o poder público manter o preço dos combustíveis baixos?

Tem. Olha, o governo federal é o maior acionista da Petrobras. Ele tem a maior parte do Conselho de Administração. O Presidente da República pode nomear o presidente da Petrobrás. Ele nomeia, decide a política de preços e a política de preços não vai obedecer aos interesses das bolsas de valores, ele vai ter o interesse voltado para uma economia que não exploda em inflação. Então é possível controlar isso, aliás, inclusive, era possível até o governo ampliar o seu controle sobre a Petrobras, porque quando ele decidisse: “olha, os preços dos combustíveis não serão exorbitantes”, as ações nas bolsas de valores vão cair. O governo podia recomprar nesse momento de baixa as ações nas bolsas de valores e ficar com percentual ainda mais alto do controle da empresa, tá claro? Então é possível, tem mecanismos para reverter essa doença do lucro, do superlucro, do lucro extraordinário em cima do empobrecimento da população.

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Edição: Camila Garcia