O prazo apertou

TCU adia julgamento e trava privatização da Eletrobras por Bolsonaro

Ministro quer mais tempo para avaliar preço da estatal, o que atrapalha sua venda por Bolsonaro

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |

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Manifestantes contra a privatização da Eletrobras protestam em Brasília, em junho de 2021 - Alessandro Dantas

A decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a privatização da Eletrobras foi adiada. O ministro Vital do Rêgo pediu mais tempo para avaliar a questão e, com isso, paralisou o projeto de venda do controle da estatal tocado pelo governo do presidente Jair Bolsonaro (PL).

Vital do Rêgo disse que identificou inconsistências no projeto. Por isso, pediu 60 dias para avaliá-lo.

Ministros da Corte de Contas argumentaram. Liderados Jorge de Oliveira, indicado ao TCU pelo presidente Bolsonaro, defenderam que do Rêgo reduzisse seu prazo de vistas já que ele poderia inviabilizar a venda da Eletrobras ainda durante este governo.

Vital do Rêgo, então, aceitou aprofundar-se sobre a questão por 20 dias. Esse é o prazo mínimo garantido a ministros do TCU sempre que eles solicitam mais tempo para estudar um processo.

Na prática, portanto, o projeto de privatização da Eletrobras ficará parado na Corte de Contas até 10 de maio.

Segundo o cronograma do governo federal para a venda de ações da Eletrobras, isso ocorreria ainda no primeiro trimestre de 2022, num leilão. O primeiro trimestre já acabou e a análise do TCU sobre a privatização –requisito para que o projeto avance– não terminou.

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A Eletrobras tem ações negociadas na Bolsa de Valores de Nova York. Por isso, também precisa cumprir regras americanas para sua privatização.

Essas regras estabelecem prazos para venda de ações vinculadas à divulgação de balanços das empresa. Se a Eletrobras quer vender suas ações considerando informações de 2021, divulgadas no balanço referente daquele ano, a empresa precisa concluir essa operação até o dia 13 de maio –prazo apertado considerando o adiamento desta quarta-feira.

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Existe então a possibilidade de a Eletrobras vender suas ações com base no balanço do primeiro trimestre da empresa, que deve ser divulgado em maio. Aí, o prazo para conclusão da venda passa para agosto –a um mês da eleição. Esse prazo até pode ser cumprido, mas ainda depende da aprovação do TCU.

O problema aí é que grandes fundos de investimento têm regras de governança que impedem que eles façam negócios com governos no período eleitoral. A privatização, então, correria risco de não ocorrer por conta da falta de interessados no negócio.

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A vice-presidente da Confederação Nacional dos Urbanitários (CNU), Fabíola Antezana, disse que o governo tem pressa para privatizar a Eletrobras porque sabe que o calendário eleitoral tende a atrapalhar a operação. Ela alertou que, apesar da decisão do TCU, ainda há, sim, chances de a Eletrobras ser privatizada por Bolsonaro neste mandato.

Antezana ressaltou, porém, que uma lei sobre a privatização da Eletrobras foi aprovada pelo Congresso e sancionada por Bolsonaro. Ela não estabelece prazo para que isso ocorra. Portanto, caso Bolsonaro seja reeleito ou outro presidente queira dar continuidade à venda, isso está oficialmente autorizado.

“A única coisa que não deixará a Eletrobras ser privatizada é uma nova legislação, que não vira deste agora”, afirmou ela.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), pré-candidato à eleição e líder em todas as pesquisas de intenções de voto, já declarou ser contra a venda da Eletrobras. Ciro Gomes (PDT) também.

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Impasses e consequências

A privatização da Eletrobras já foi aprovado numa primeira avaliação do TCU em fevereiro, por 6 votos a 1. O voto contrário foi justamente do ministro Vital do Rêgo, que apontou para um erro no cálculo do valor da empresa.

Ele estimou que ela valha R$ 130 bilhões. O governo, no entanto, estima que a privatização renda R$ 67 bilhões.

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Nesta quarta, Vital do Rêgo voltou a falar dessa diferença de valores. Informou que duas avaliações sobre o valor da Eletrobras contratadas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) apresentaram diferenças consideráveis. Sugeriu a contratação de uma terceira.

Ele disse ainda que o governo prometeu um crescimento de investimentos com a venda da Eletrobras. Segundo do Rêgo, documentos enviados ao TCU não comprovam que esses aportes serão realizados.

O ministro ainda disse que faltam estudos claros sobre o impacto da venda do controle da Eletrobras sobre as contas de luz. Antezana, da CNU já publicou um artigo no Brasil de Fato apontando que as contas de luz devem subir 25% caso a Eletrobras seja mesmo privatizada como quer o governo.

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Fora isso, a privatização também deve comprometer o trabalho do maior centro de pesquisa do setor elétrico da América Latina, o Centro de Pesquisa de Energia Elétrica (Cepel). Também deve desabrigar 1,5 mil famílias em Candiota (RS).

Edição: Rodrigo Durão Coelho