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As imposições para vacinação dos profissionais da educação no Ceará contra a covid-19

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Ninguém mais do que os professores entendem, e são sensíveis, as dificuldades que os estudantes e seus parentes, sobretudo as mães, passam nesse momento de suspensão das aulas presenciais. - Foto: Tatiana Fortes / GOVCE
Professores nunca trabalharam tanto em situações ainda mais adversas e desconfortáveis que o normal.

Os profissionais da educação do Ceará foram incluídos entre os grupos prioritários para a imunização contra a covid 19 no estado, a partir de um acordo entre o governo estadual, o Ministério Público (Federal e Estadual) e o Ministério da Saúde, no mês de maio. Vacinação que teve início na semana passada, já garantindo a primeira dose para um número considerável do público. Porém, tal decisão teve como contrapartida a imposição de um fatídico termo de retorno às aulas presenciais com a seguinte declaração: “ (…) comprometendo-me a retornar as minhas atividades profissionais no segundo semestre do corrente ano, desde que devidamente autorizada pela Autoridade Sanitária Municipal de onde laboro, caso ainda não tenha retornado efetivamente as minhas atividades de forma presencial”.  

A chantagem governamental foi refutada por todas as entidades e sindicatos de trabalhadores da educação, como Sindicato APEOC e SINDUECE. O Primeiro, inclusive, criou um canal de denúncias para que professores e demais servidores da educação básica possam registrar as situações de constrangimento daqueles que se recusaram a assinar o documento. O segundo, representante dos professores da Universidade Estadual do Ceará (UECE), impetrou um mandato de segurança coletivo contra a imposição do termo.

Essa exigência desnecessária por parte do poder público, na minha avaliação, é uma concessão vergonhosa às pressões do empresariado da educação do estado, como o Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Ceará (SINEPE-CE) que, desde o início da pandemia procura, a qualquer custo retomar as atividades presenciais, mesmo com inúmeros casos de profissionais da rede privada de ensino já contaminados e até mortos, abafados pela mídia comercial e minimizados pelos grupos educacionais.

Uma imoralidade, consequência das polêmicas ensejadas pela obrigatoriedade do termo, é a tentativa de desmoralização dos professores, como se estivessem fazendo corpo mole, como se não quisessem trabalhar, como se fossem privilegiados, e todas as verborragias desprezíveis contra a categoria.

A despeito de tais argumentos, várias pesquisas demonstram o processo de intensificação da jornada de trabalho docente nesse contexto pandêmico e as condições precárias de acesso à internet e equipamentos necessários para o ensino remoto, tanto por professores quanto por alunos, além do aumento de adoecimentos psíquicos. Situação secundarizada por pseudo-especialistas em educação e pelos detratores da escola pública.  

Na verdade, os professores brasileiros e cearenses nunca trabalharam tanto, em situações ainda mais adversas e desconfortáveis do que o normal. Os professores que hoje estão submetidos à dinâmica sufocante do ensino remoto, são os principais interessados pelo retorno presencial às salas de aula, mas não de qualquer jeito. 

Ninguém mais do que os professores entendem, e são sensíveis, as dificuldades que os estudantes e seus parentes, sobretudo as mães, passam nesse momento de suspensão das aulas presenciais. Porém, mesmo que a grande maioria dos profissionais da educação recebam as duas doses da vacina nos próximos três meses, isso, por si só, não garante a segurança sanitária necessária para o retorno. Sem testes e rastreamento dos casos, com a infraestrutura inadequada das escolas e com falta de perspectivas de vacinação do restante da população, inclusive dos discentes, as instituições de ensino agravariam ainda mais a situação que vivemos, tornando-se catalisadoras da disseminação do vírus. 

A grande maioria dos burocratas estatais e donos de escolas estão pouco se lixando para o aprendizado das crianças e jovens, e não têm preocupação nenhuma com a saúde dos profissionais da educação e das famílias dos alunos. Só querem a volta das aulas presenciais, mesmo com a pandemia descontrolada e com a escassez de vacinas, para darem satisfação a seus chefes e padrinhos políticos ou para amenizar suas perdas financeiras.

Em vez da desfaçatez desse termo e do desrespeito escancarado aos trabalhadores que dedicam todas as suas energias à formação das novas gerações de cidadãos e cidadãs que podem construir um futuro mais esperançoso para o país, que tal tratarmos a educação com a devida atenção e seriedade que ela merece, sem ameaças e demagogias? Os profissionais da educação já decidiram que não serão cúmplices do genocídio em curso, mas sim defensores da vida e do conhecimento, tão ameaçados pelo coronavírus e pela ignorância.

Edição: Francisco Barbosa