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Pingos nos is: esquerda, direita e centro

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Movimentos sociais vinculados à esquerda constroem projetos e difundem ideias pautadas na igualdade

Atribui-se a origem histórica dos conceitos de esquerda e direita à forma como os parlamentares  eram distribuídos na Assembleia Nacional após a Revolução Francesa, em 1789. Do lado esquerdo do oratório se estabeleciam os representantes de grupos de trabalhadores e profissionais liberais defensores das bandeiras mais radicais do processo revolucionário, como o sufrágio universal, a garantia do acesso à educação pública e laica, o fim dos privilégios hereditários, etc. Já do lado direito do púlpito, encontravam-se porta vozes dos setores mais conservadores da sociedade francesa, como aristocratas, comerciantes e a burguesia emergente, esses a maioria no parlamento.

Em linhas gerais, os partidos e movimentos sociais vinculados à esquerda constroem projetos e difundem ideias pautadas pelos princípios da igualdade, justiça, liberdade e solidariedade. A partir do final do século XIX, a esquerda passa a ser caudatária, principalmente, das tradições políticas socialistas, comunistas e anarquistas. Apesar das diferenças entres elas, possuem em comum a crítica contundente aos alicerces que sustentam o modo de produção capitalista, como a propriedade privada dos meios de produção, a exploração do trabalho e as formas de organização e violência operadas pelo Estado burguês.

Já as organizações e sujeitos identificados com a direita se organizam a partir de princípios da ideologia liberal, como a defesa intransigente da propriedade privada, a meritocracia e a livre iniciativa do mercado. Ao longo do século XX algumas diferenças importantes foram se desenvolvendo no interior da direita. Existem, por exemplo, frações socialdemocratas, neoliberais, fascistas, dentre outras. Porém, mesmo com suas divergências programáticas ou pontuais, todas se unificam, em última instância, contra os interesses e lutas da classe trabalhadora. 

Há ainda agrupamentos que podemos caracterizar enquanto centro, por não se alinharem organicamente nem a esquerda e nem a direita. Suas posições políticas e ideológicas são mais flexíveis, oscilando de acordo com as mudanças conjunturais e mantendo certo distanciamento das contradições e conflitos inerentes à luta de classes.

Importante frisar que não há homogeneidade no âmbito dessas tradições políticas, no interior da esquerda, da direita e do centro existem diferenças a serem consideradas. Alguns setores são mais moderados e outros mais radicais em suas posições. Algumas alas são ideologicamente mais ortodoxas, enquanto outras são mais ecléticas. Algumas correntes possuem uma base social mais larga e orgânica, já outras são controladas por cúpulas e burocracias autônomas.

Nos últimos anos instalou-se no Brasil uma verdadeira confusão em torno do uso dessas terminologias nas análises e opiniões políticas, das mais especializadas as mais desinteressadas. Confusão provocada intencionalmente e bastante útil aos defensores de uma suposta nova política e por candidaturas tidas como outsiders, falsamente colocadas como independentes da chamada velha cultura política brasileira. 

Inclusive o bolsonarismo, alinhando com a estratégia da extrema direita internacional, prolifera nas redes sociais determinadas narrativas conspiratórias direcionadas aos seus apoiadores mais fiéis, em torno de mentiras acerca de ideias e pautas vinculadas aos movimentos populares (camponeses, sem tetos, LGBTs, negros, juventude das periferias, feministas, etc), a partir, sobretudo, da manipulação de valores cristãos, em aliança com lideranças e grupos evangélicos neopentecostais, milícias dentro das forças de segurança e agentes econômicos que apoiam o atual presidente. Vide, kit gay, ideologia de gênero, globalismo, “comunavírus” e outras fantasias.

No Congresso Nacional temos como principais partidos no campo da esquerda, o Partido dos Trabalhadores (PT), o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). Na direita, o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), o Democratas (DEM) e o Partido Social Liberal (PSL). Já no centro, destacam-se o Partido Democrático Trabalhista (PDT), a Rede Sustentabilidade (REDE), o Partido Verde (PV) e o Partido Socialista Brasileiro (PSB).

Cuidado para não confundirmos o que estamos caracterizando de centro com o que acostumou-se apelidar de “centrão”, que é, na verdade, um campo político que aglutina diversos parlamentares de direita no congresso nacional brasileiro, dos partidos mais tradicionais até meras legendas de aluguel, a partir de seus interesses corporativistas e fisiológicos, sobretudo com a troca entre o apoio a projetos e interesses do governo, por cargos em órgãos estatais e emendas parlamentares.

Nesse cenário de confusões e incertezas, os protagonistas da disputa presidencial de 2022 já se colocaram no páreo. Oportunisticamente, parte considerável dos futuros candidatos que se opõem ao presidente, inclusive seus ex-aliados João Dória (PSDB) e Mandetta (DEM), além de apoiadores fieis do lavajatismo, como o apresentador Luciano Huck e mesmo Ciro Gomes (PDT), têm apelado para teses difusas de construção de uma frente política que supere a ideia de esquerda e direita, considerada por eles algo ultrapassado. Os defensores dessas supostas alternativas à polarização entre Lula e Bolsonaro, ao que todas as pesquisas indicam, não estarão no segundo turno. Aí o antipetismo direitista ou centrista de 2018 não vale mais, nem a aliança "Bolsodoria" e nem viajar de férias para Paris.

Edição: Monyse Ravena