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Educação

Professores da rede pública e privada avaliam os desafios do ensino na pandemia

Desde março de 2020, estudantes e professores tiveram que se adaptar às atividades letivas em ambientes virtuais

Brasil de Fato | Fortaleza (CE) |
Professores acreditam que 2021 ainda será um ano de dificuldades - Altemar Alcantara Semcom

A crise de saúde pública provocada pela covid-19 fez com que a forma de ensino mudasse drasticamente em todos os níveis. Desde março de 2020, estudantes e professores tiveram que se adaptar às atividades letivas em ambientes virtuais, passados 11 meses do início da pandemia algumas instituições de ensino já começam a ter encontros presenciais, mas ainda gera implicações nas vidas de alunos e professores. O Brasil de Fato Ceará conversou com alguns docentes para saber quais impactos a pandemia tem em suas vidas.
    
Mirella Hipólito, psicanalista e professora da rede privada do ensino superior explica que, no início da pandemia, a transição para o ambiente virtual na universidade privada foi muito rápida e que não houve tempo para entender o que estava acontecendo, “quase todas as universidades privadas pararam na terça e na quinta já estavam todos funcionando virtualmente, não tivemos nenhum tipo de preparo”. 

Ela relata que nas primeiras semanas de pandemia muitos grupos de troca de mensagens foram criados entre os professores da instituição no intuito de debater quais seriam os melhores programas de videoconferência, planos de aula e troca de impressões. Contudo os grupos começaram a receber uma quantidade enorme de mensagens, às três horas da manhã e aos fins de semana, “esses grupos ficaram por mais de um mês falando de forma frenética, não existia mais hora, esses grupos representavam o desespero dos professores”, afirmou Mirella. Uma outra questão apontada foi a mudança na relação de cobrança entre professores e estudantes no âmbito virtual, “se o aluno mandar uma mensagem em pleno domingo e o professor não responder, na avaliação esse professor não é acessível, é algo que é extremamente adoecedor”. 

Vicente Olsen, professor do ensino médio da rede privada também relata a forma abrupta que te teve que se adaptar a norma forma de lecionar, “inicialmente o que teve foi uma correria para encontrar a melhor forma de transmitir os conteúdos e as aulas, começando com aulas gravadas e depois passando para aulas remotas online”. Ele também relata que vários colegas enfrentaram problemas como redução da jornada de trabalho, perda de parentes e desenvolvimento de problemas de saúde mental, no entanto que é preciso dar suporte aos estudantes, “somos o lado profissional da educação, temos que mostrar para os nossos alunos que eles não estão sozinhos, que há um suporte em quem eles podem se apoiar e confiar”, afirmou.

Segundo Valdir Teixeira, professor da rede estadual de educação pública, não houve uma melhora significativa com o passar da pandemia, “continuamos na mesma realidade, carga horária dupla, trabalhando em casa tendo que dar apoio no ensino remoto para nossos filhos, uma situação bem complicada”. De acordo com Valdir, o governo do estado não deu o suporte necessário para que os professores pudessem dar as aulas de forma remota, não houve disponibilização de material como computadores e algumas poucas formações de ferramentas de videoconferência, “muitos professores aprenderam a manejar as ferramentas de ensino online de forma autodidata”, afirmou Valdir. Um outro problema enfrentado pelos professores da rede pública é o decreto federal que congelou os salários do funcionalismo público, “nós temos um decreto do governo federal que congelou nossos salários por dois anos, em um momento em que estamos tirando dinheiro do nosso próprio bolso para dar aulas remotas”, finaliza.

Para Danyelle Nillin, professora da Universidade Federal do Ceará, um dos maiores problemas enfrentados é justaposição entre os horários de trabalho e o de descanso, “quando a gente percebia, estávamos trabalhando há 14 horas, 16 horas por dia, aos fins de semana, isso aconteceu nos primeiros meses da pandemia”. A área de atuação de Danyelle também fez com que ela trabalhasse mais, socióloga, realizou quatro pesquisas nos primeiros meses da pandemia. Outro grande desafio foi adaptar a forma de aula para o ensino remoto e fazer com que os estudantes ficassem motivados, “muitos alunos estão passando por situações muito difíceis financeiramente, com perdas familiares, ansiedade e depressão”, afirmou. 

Expectativas para 2021

Todos os professores apostam que o ano de 2021 ainda será de aulas remotas ou no formato híbrido, quando se tem uma combinação entre aulas presenciais e no ambiente virtual. As escolas particulares estão desde setembro de 2020 autorizadas a retornar às aulas, desde que seguindo protocolos sanitários e respeitando 30% da capacidade. Já para os estudantes da rede pública estadual, o governo do estado autorizou o início do ano letivo de 2021 na modalidade híbrida. 

Segundo a Secretaria Estadual de Educação (Seduc) deverá ser levado em consideração o cenário epidemiológico do coronavírus, o rodízio de alunos e o escalonamento de turmas. Segundo Valdir Teixeira, há uma diretriz que para que as escolas decidam entre o ensino híbrido ou remoto, “28% das escolas optaram pelo sistema híbrido, achei interessante, além de mais democrático”, afirmou Valdir. Ele espera que que haja vacinação para professores e estudantes o mais rápido possível, além de um aparo financeiro do estado para custear os materiais necessários para o ensino remoto e formações mais direcionadas para o uso das plataformas de ensino virtual.

Mirella Hipólito vê que o formato híbrido prejudica a rotina do professor, podendo atrapalhar principalmente aqueles que tem outros trabalhos, filhos ou pais idosos. Segundo Mirella, os professores nunca trabalharam tanto na vida e isso deve piorar em 2021, “eu acho que 2021 vai ser muito pior, as instituições privadas estão preocupadas com o lucro e isso faz com que passe por cima de processos que são importantes”.

Para Vicente Oslen, as aulas remotas online deverão ser cada vez mais comuns e que o modelo híbrido deva permanecer até o final de 2021, “não creio que a normalidade vá voltar tão cedo, principalmente com a evolução dos casos da segunda onda que estamos vivenciando e com a péssima gestão que temos no Ministério da Saúde, totalmente negligente em relação à pandemia e à vacinação”, afirmou o professor.

Edição: Monyse Ravena