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A consciência alimenta a coragem, e isso contagia

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"O importante é não se acovardar, ter consciência, ter coragem. Resistir. E como faz a bancada de oposição, avançar, sem vacilar" - Foto: Assessoria bancada de oposição
Sabemos há tempos, que o tempo passa e que a realidade sempre muda quando mudamos com ela

Para registro inicial, 2021 inicia com a proibição do uso do herbicida glifosato e do milho transgênico, no México. Por decreto, o presidente Andrés Manuel López Obrador estabeleceu prazo de 3 anos para eliminação total e substituição daquelas “tecnologias”, “por alternativas sostenibles y culturalmente adecuadas, que permitan mantener la producción y resulten seguras para la salud humana, la diversidad biocultural del país y el ambiente”. 

Por aqui, em que pese as campanhas por sua proibição, são despejados anualmente cerca de 200 milhões de litros de glifosato. E se trata de apenas um dentre mais de mil tipos de agrotóxicos de uso estimulado no Brasil, pela administração deste presidente que não cansa de nos envergonhar.

Apontado por consórcio internacional da mídia independente (Organized Crime and Corruption Reporting Project - OCCRP), como "Pessoa Corrupta do Ano", Bolsonaro não recebeu tal destaque por sua atuação tida como “vergonhosa” pela União Europeia, em relação à pandemia que aqui já matou 200 mil pessoas. Não, aquele título que nos constrange a todos se apoia em indícios de corrupção pura, no velho estilo que bolsonaristas juravam combater, e que cresce solta, no ritmo da distribuição de cargos, emendas, favores e encenações inescrupulosas como a da Praia Grande, no litoral paulista.

Com os bolsonaristas e seus serviçais chegamos a tal ponto de degradação espiritual e moral que para recuperar as possibilidades de vida digna, precisaremos recriar a sociabilidade perdida. Verdade, não é apenas aqui, que a humanidade precisa se reencontrar e superar as discriminações, as injustiças e a destruição ambiental. Mas considerando que na opinião do planeta somos o exemplo do que há de pior, aqui são mais necessários os avanços que permitam redistribuição de oportunidades, de poder, de acesso a direitos humanos e dignidade pública.

Mas isto não virá sem as lutas que se anunciam vitoriosas na contramão do que vinha acontecendo até 2020. Vejam os países vizinhos e notem que aqui a juíza federal Clarides Rahmeier acaba de suspender o processo de licenciamento da Mina Guaíba. Projetado pela Copelmi Mineração, com apoio de diferentes governos estaduais e omissão ou anuência de todos os prefeitos, aquele empreendimento, que dizimaria três aldeias indígenas, acabaria com importantes áreas de produções de base agroecológica e reservas ambientais, além de envenenar o ar e a água em que se apoiam a saúde e qualidade de vida de 4,5 milhões de pessoas da Região Metropolitana de Porto Alegre, entra em coma sob a caneta da Dra. Clarides.

Mas a disputa não está concluída e a sociedade, em reação continuada (ver petição para banir a mina Guaíba), mostra que Porto Alegre cansou de se conformar com ofensas à democracia. Esta semana, na Câmara de Vereadores de Porto Alegre, tivemos a gota dágua que sinaliza retomada da participação popular.

Como preâmbulo, considere-se que analistas políticos, têm destacado o atendimento a agendas locais, a causas identitárias e aos marginalizados, como essenciais para o sucesso das administrações públicas. A isso se soma o manejo das redes sociais e o apoio de marketing midiático, que embora condições necessárias, não seriam em si suficientes para conter reações.

Nesta perspectiva, os novos homens e mulheres públicos necessitariam mais do que aparentar compromisso com interesses e necessidades tradicionalmente esquecidas pelas castas que controlam o Estado e a Capital. Precisariam, de fato, atuar, ou multiplicar em muito aqueles esforços de prestidigitação e maquiagem que Bolsonaro usa e que aqui pareciam funcionar até a era Marchezan. Também é possível que tratem de esquecer as boas maneiras, abandonar a encenação, e assumir o papel de pai patrão, onde eles mandam, enquanto podem e dane-se o público.

Pelo que se viu na Câmara de Vereadores de Porto Alegre, dia primeiro, a banda golpista optou pelos piores caminhos: a mentira, e o chicote.

De um lado, o prefeito Melo se fez de policial bonzinho. Prometeu diálogo, respeito às diferenças, à legislação e à proteção social. De outro lado, e sem mudar o tom de voz, afirmou que a reforma da Previdência é necessária e que vai avançar (“porque falta dinheiro até para podar árvores”) em novo tempo de tolerância zero à corrupção a seu estilo. Afirmou com todas as letras que as “multas injustas” serão canceladas porque aqui “sobram leis, mas faltam atitudes”.

No mesmo dia, as bases de Melo na Câmara dos Vereadores rasgaram o regimento da Casa, ofenderam a democracia e fizeram de tudo para anular a importância e a representatividade dos resultados eleitorais de 2020. 

Apesar do artigo 32 do regimento interno da Câmara prever ocupação de cargos, respeitando representatividade do número de vereadores de cada partido, a oposição, que conta com 10 dos 36 vereadores, incluindo os dois mais votados (Karen Santos e Pedro Ruas), e que obteve cerca de 30% das opções populares, foi excluída de todos os postos previstos em lei.

Duas das três maiores bancadas (PT e PSOL, com 4 vereadores cada) ficaram de fora, enquanto o PDT, com o mesmo número de cadeiras que o PCdoB (dois vereadores), assumiu a presidência da Casa.

A bancada inédita de jovens negros, quatro mulheres e um homem, foi desconsiderada e ofendida na primeira sessão do primeiro dia desta legislatura. Mas não se intimidou. Mostrou a que veio e que não está só. A polêmica sobre o Hino Rio Grandense, que atribui falta de virtudes, a quem é escravizado, bem como a lição de história, de moral e civismo, que o vereador Matheus Gomes ofertou à vereadora comandante, à vereadora psicóloga, a seus colegas e a todos gaúchos que acompanhavam a sessão mostraram que estamos diante de novos tempos.

A minoria sabe que com a coragem e a representatividade que carrega, basta não titubear que crescerá com o apoio de uma sociedade atenta. Como diz o slogan do vereador Leonel Radde, com que todos concordamos: "ninguém faz nada sozinho". E nos orgulhamos disso. Esta confiança nos pares, que une a bancada de oposição simplesmente inexiste na aliança daqueles oportunistas e golpistas que, não se iludam, trabalham por uma herança que envergonhará seus filhos e netos.

Sabemos há tempos, que o tempo passa e que a realidade sempre muda quando mudamos com ela.

Sabemos que o importante é não se acovardar, ter consciência, ter coragem. Resistir. E como faz a bancada de oposição, que nos representa na Câmara de Vereadores de Porto Alegre, avançar, sem vacilar. Ainda que para isso se faça necessário segurar a primavera nos dentes. 

 

OBS: Amigues leitores. Os links são opções de acesso, para eventuais interessados nas fontes citadas. Recomendo, enfaticamente, tão somente que não deixem de escutar a música. Que ela nos inspire.

Edição: Katia Marko