Ceará

2020

Artigo | Coronavírus, o novo prefeito

Antes de saber oficialmente quem serão os candidatos eu digo, o coronavírus venceu as eleições.

Brasil de Fato | Fortaleza (CE) |
A pandemia pelo novo coronavírus mudou drasticamente a forma que nos comportamos no mundo. - Foto: SMS

A cada quatro anos se repete em toda cidade do Brasil um evento único, que são as eleições municipais. Para além de decidir quem serão os novos prefeitos e vereadores, as essas eleições mudam a cara das cidades, os comícios, os carros de som, as obras e inaugurações se multiplicam. Mas esse ano terá um novo concorrente na maioria dos municípios, um concorrente de peso que se ouve a comemoração de “já ganhou”. Antes de saber oficialmente quem serão os candidatos eu digo, o coronavírus venceu as eleições.

A pandemia pelo novo coronavírus mudou drasticamente a forma que nos comportamos no mundo, chegar em casa virou um enorme trabalho, tirar roupas, lavar máscaras, higienizar alimentos. Mas aqui eu quero fazer um exercício mental de um outro cenário: como serão as eleições de 2020? 
Já foi aprovado pelo Congresso Nacional o adiamento das eleições em mais de um mês, mas certamente esse intervalo não será suficiente para achar uma vacina ou a cura do novo coronavírus, a tarefa vai ser adaptar as eleições, e essa não vai ser uma tarefa fácil. Como pensar as eleições sem os comícios de milhares de pessoas ou os candidatos que andam de casa em casa pedindo votos? Como enfrentar as enormes filas nas zonas eleitorais? Essas ações certamente não deverão acontecer, ou pelo menos, não deveriam acontecer.

Novas formas da disputa eleitoral vão surgir, algumas delas o brasileiro já conhece bem, como é caso da campanha nas redes sociais. Teremos que nos acostumar cada vez mais com anúncios de candidatos no Facebook, comícios por lives no Youtube e muita gente pedindo seu voto no Whatsapp. Será que teremos uma eleição parecida com a de 2018, recheada de fake news? Eu acho que sim, e acho também que as campanhas já começaram faz tempo. Nossas redes socais já estão inundadas de fake news, o coronavírus não será apenas o vencedor, ele será também um cabo eleitoral dos melhores. Gente que diz que achou uma cura milagrosa (que não existe), gente que fala mal dos prefeitos e governadores por causa do isolamento social, algo me faz pensar que essas pessoas não ficarão muito longe das urnas eleitorais. 

O coronavírus é o assunto do momento e ganhará quem souber usar melhor dele. Os atuais prefeitos e vereadores estarão numa situação muito complicada, o Brasil não vê seus casos e mortes diminuírem, enquanto a economia vai cada vez mais ladeira abaixo. Muitos tentarão culpar o isolamento social por provocar esse caos e de forma desleal separar o debate entre saúde e economia, como se tivéssemos que escolher entre nossa vida ou nosso emprego.  

Essas pessoas esquecem, ou pelo menos fingem esquecer, que o isolamento social é a medida mais efetiva para conter o vírus, e que a queda na economia não é por causa do isolamento, mas por causa da maior crise de saúde do século. Se é ou se não é, numa campanha não importa, o importante é o que as pessoas acreditem que seja. A reeleição, e a própria eleição, encontrou uma pedra no caminho, seguir a ciência significa ter como adversário o presidente e seu exército de cloroquinions. 

Antes da pandemia nós estávamos à beira do abismo, agora demos um passo à frente. As máscaras e o álcool em gel não serão capazes de conter a pandemia de votos que os candidatos mais extremistas ganharão, temos que correr para achar uma vacina rápido, não só para o vírus, mas também para as eleições.

*Integrante da Rede de Médicos e Médicas Populares no Ceará

Edição: Monyse Ravena