Mobilização

Mulheres do MST querem protagonismo feminino na luta social: "Estamos só no começo"

“É importante entender a gravidade da situação histórica na qual a gente está”, afirma Kelli Mafort

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Cerca de 3.500 mulheres atualmente reunidas no 1º Encontro Nacional das Mulheres Sem Terra, em Brasília (DF) - Foto: Janine Moraes

Em meio ao cenário de avanço do autoritarismo e, mais especificamente, de práticas identificadas com o fascismo, as cerca de 3.500 mulheres atualmente reunidas no 1º Encontro Nacional das Mulheres Sem Terra, em Brasília (DF), pensam sua caminhada política a partir da consolidação de um protagonismo feminino na luta social.

“Acho que a prioridade é de lutar pelos nossos direitos, combater a opressão, o machismo, até porque não são só os homens que lutam pela terra. Pelo contrário, as mulheres têm um grande papel na caminhada da luta por direitos também”, frisa a militante Iara Cristina Silva Lopes, de 17 anos, que veio do Paraná para engrossar as fileiras do evento.

 

Para o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), os diferentes papéis políticos e sociais desempenhados pelas mulheres nas comunidades as colocam na centralidade da luta popular, especialmente no que se refere ao combate às pautas que ampliam a retirada de direitos.

“Sabemos que a resistência nos territórios depende muito das mulheres porque são as companheiras que estão lá na ponta, na base, e o tipo de produção das mulheres dos assentamentos é de resistência, de consumo. É uma produção que acaba garantindo a alimentação das próprias famílias. E as mulheres também estão na base dos acampamentos”, explica Kelli Mafort, da direção nacional do MST.

A dirigente cita a preocupação com medidas como as que regularizam a grilagem de terras, oficializada inicialmente no governo Temer e que, agora, passa por um aprofundamento por meio da Medida Provisória (MP) 910, editada pelo presidente Jair Bolsonaro em 2019.  

Esse tipo de iniciativa é visto também como uma das facetas do avanço do neoliberalismo e do fascismo no país, temas que hoje as sem-terra tomam como prioridade nas trincheiras de luta. Com base nisso, Kelli Mafort reforçou, nesta sexta-feira (6), o coro do MST em torno da importância da mobilização popular no campo.

“O movimento de moradia costuma dizer que, ‘enquanto morar for um privilégio, ocupar é um direito’. E nós temos que dizer: enquanto se alimentar for um privilégio, ocupar terras para a reforma agrária é um direito legítimo dos povos”, bradou, em meio às 3.500 participantes que se reúnem no 1º Encontro Nacional das Mulheres Sem Terra.

Reconfiguração

A professora Marina Gouvêa, do curso de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), pontua que o momento atual seria marcado não só por um retrocesso em si, mas por uma “reconfiguração completa do capitalismo e das classes dominantes”.


"O MST tem o potencial de criar respostas efetivas para este momento", acredita professora Marina Gouvêa, do curso de Economia da UFRJ / Credito: Wellington Lenon

“É a ofensiva da burguesia sobre as trabalhadoras e trabalhadores do mundo. Esta palavra ‘ofensiva’ é bem importante porque houve épocas na história em que eles também nos atacaram, mas eles estavam na contraofensiva.É importante, neste momento, a gente entender a gravidade da situação histórica na qual a gente está”, pontua.

Nesse sentido, a economista sublinha que a atuação de movimentos como o MST cumpre um papel elementar na transformação da realidade social diante do aprofundamento do neoliberalimo no Brasil e no mundo.

“É um movimento que luta por território e que realmente propõe outras práticas de vida, propõe a desmercantilização, que é o mais fundamental [diante] do capitalismo e da reprodução capitalista, e por isso o MST tem o potencial de criar respostas efetivas”, afirma a professora.

Convocatória

Com base nisso, as militantes do movimento intensificam, durante a programação do encontro, o chamado para que mulheres de outros espaços se somem à luta. A ideia é aproveitar o contexto das comemorações do 8 de Março, quando é celebrado o Dia Internacional da Mulher.

“Nossa luta está só no começo. Precisamos fazer nosso trabalho de base nas periferias, chamar mais gente pra nossa luta e massificar esse movimento, pra gente fazer as lutas de que o povo tanto necessita. Estamos em março, e março tem um aroma especial, é quando nós sentimos nos nossos rostos um vento especial. Queremos fazer com que esse vento que nos acaricia agora vire uma ventania pra que, de fato, a gente possa cravar as transformações”, conclui Kelli Mafort.

Edição: Leandro Melito